Leia um trecho do livro:
Chigurh estendeu um dólar sobre o balcão. O homem abriu a caixa registradora e empilhou o troco diante dele do modo como um carteador de cassino coloca as fichas. Chigurh não tinha tirado os olhos dele. O homem desviou o olhar. Tossiu. Chigurh abriu o pacote plástico de castanhas-de-caju com os dentes e despejou um terço do pacote na palma da mão e começou a comer.
Mais alguma coisa? o homem disse.
Não sei. Será?
Tem algo errado?
Com o quê?
Com alguma coisa.
É isso o que você está me perguntando? Se tem algo errado com alguma coisa?
O homem se virou e colocou o punho fechado sobre a boca e tossiu outra vez. Olhou para Chigurh e ele desviou o olhar. Olhou pela janela para a frente da loja. As bombas de gasolina e o carro parado lá. Chigurh comeu mais um punhadinho de castanhas-de-caju.
Mais alguma coisa?
Você já me perguntou isso.
Bem é que eu preciso fechar.
Fechar.
Sim senhor.
A que horas você fecha?
Agora. Fechamos agora.
Agora não é um horário. A que horas você fecha?
Normalmente ao escurecer. Quando escurece.
Chigurh ficou ali mastigando devagar. Você não sabe o que está dizendo, não é mesmo?
Perdão?
Eu disse você não sabe o que está dizendo não é mesmo.
Estou dizendo que é hora de fechar. Isso é o que eu estou dizendo.
A que horas você vai para a cama.
Perdão?
Você é meio surdo, não? Eu disse a que horas você vai para a cama.
Bem. Eu diria que por volta das nove e meia. Mais ou menos por volta das nove e meia.
Chigurh despejou mais castanhas na palma da mão.
Eu poderia voltar a essa hora, ele disse.
Nós vamos estar fechados.
É verdade.
Bem por que então o senhor ia voltar? Vamos estar fechados.
Você já disse isso.
Bem vamos mesmo.
Você mora naquela casa atrás da loja?
Moro sim.
Morou ali a vida toda?
O proprietário levou um tempo para responder. Essa era a casa do pai da minha mulher, ele disse. Originalmente.
Você se casou só para poder ficar com a casa.
Nós moramos em Temple Texas durante vários anos. Criamos uma família ali. Em Temple. Viemos para cá há uns quatro anos.
Você se casou só para poder ficar com a casa.
Se é o que o senhor acha.
Não é assim que eu acho. É assim que é.
Bem agora eu preciso fechar.
Chigurh despejou o restante das castanhas na palma da mão e amassou o pacote de plástico e colocou em cima do balcão. Estava de pé de forma estranhamente ereta, mastigando.
O senhor parece ter uma porção de perguntas, o proprietário disse. Para alguém que não quer dizer de onde veio.
Qual foi o máximo que você já perdeu jogando cara ou coroa?
Perdão?
Eu disse qual foi o máximo que você já perdeu jogando cara ou coroa.
Cara ou coroa?
Cara ou coroa.
Não sei. As pessoas normalmente não fazem apostas com cara ou coroa. Habitualmente é mais só para resolver alguma coisa.
Qual a maior coisa que você já viu ser resolvida?
Não sei.
Chigurh pegou uma moeda de vinte e cinco centavos no bolso e jogou-a para cima fazendo com que ela rodopiasse em meio ao brilho azulado das luzes fluorescentes lá no alto.Apanhou-a e prendeu-a de encontro à parte de trás de seu antebraço logo acima da atadura ensangüentada.
Escolha, ele disse.
Escolher?
Sim.
Por quê?
Só escolha.
Bem eu preciso saber o que é que nós estamos decidindo aqui.
Isso iria mudar alguma coisa?
O homem olhou para os olhos de Chigurh pela primeira vez. Azuis como lápis-lazúli. Ao mesmo tempo brilhantes e totalmente opacos. Como pedras molhadas. Você precisa escolher, Chigurh disse. Não posso escolher por você. Não seria justo. Não seria nem mesmo correto. Só escolha.
Eu não apostei nada.
Apostou sim. Está apostando a vida inteira. Você apenas não sabia. Sabe qual a data que está na moeda?
Não.
É 1958. Ela viajou durante vinte e dois anos para chegar aqui. E agora está aqui. E eu estou aqui. E estou com a mão sobre ela. E vai ser cara ou coroa. E você tem que dizer. Escolha.
Não sei o que posso ganhar.
À luz azulada o rosto do homem estava coberto por uma camada fina de suor. Ele lambeu o lábio superior.
Você pode ganhar tudo, Chigurh disse. Tudo.
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