Patricia Highsmith
Um trecho:
Chester apanhou o que Colette extraiu do invólucro de couro vermelho da carteira, tirou o seu de dentro do bolso interno do sobretudo e empurrou-os sobre o balcão para o funcionário. Sem-pre sentia um pequeno choque mental, um ligeiro desconforto, como o que tinha quando o médico lhe pedia para tirar a roupa, todas as vezes que depositava o passaporte no balcão de um hotel ou o documento lhe era tirado das mãos por um inspetor da alfândega. Chester Crighton MacFarland, um metro e se-tenta e oito, nascido em 1922 em Sacramento, Califórnia, sem sinais visíveis, esposa Elizabeth Talbott MacFarland. Sentia-se exposto. Pior, seu retrato, fato incomum em uma fotografia de passaporte, guardava uma semelhança muito boa com ele, mos-trando cabelos castanhos já um pouco escassos, mandíbulas agressivas, nariz de tamanho razoável, uma boca de feição obs-tinada, com lábios finos e um bigode sobranceiro - um exce-lente retrato, que descrevia tudo exceto a cor de seus pene-trantes olhos azuis e o rubor de suas bochechas. Será que ao recepcionista ou ao inspetor, Chester sempre pensava, essa mes-ma fotografia já não teria sido mostrada, com um pedido para que ficasse de olho nele? Aquele não era o momento de desco-brir isso, pois o funcionário empurrou os passaportes para o lado sem abri-los.
Alguns minutos depois estavam confortavelmente instala-dos num quarto amplo e aquecido, com vista para as sacadas brancas e guarnecidas de gerânios do Grande Bretagne e para uma avenida movimentada seis andares abaixo, que Chester identificou em seu mapa de Atenas como a Rua Venizelos. Eram apenas dez horas da manhã. O dia inteiro se estendia diante deles.
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