Taí um filme que eu gostaria de ver.
Um dia ideal para os peixes-banana e livros e cinema e gibis e nus e ataxia espinocerebelar e 𓋹
sábado, 25 de março de 2017
sexta-feira, 24 de março de 2017
COLINA GELADA
O ENTERRO DE POE
terça-feira, 7 de março de 2017
PÁGINA MENSUR
“A orelha moída do Jiu-jitsu seria mais ou menos equivalente à cicatriz na cara do século XIX. Existe uma admiração dos seus pares e da sociedade pelas marcas de um ritual de agressividade inerente àquilo.” Rafael Coutinho.
THE HOUSE THAT JACK BUILTS
SINOPSE: THE HOUSE THAT JACK BUILTS takes place in 1970s USA. We follow the highly intelligent Jack through 5 incidents and are introduced to the murders that define Jack’s development as a serial killer. We experience the story from Jack’s point of view. He views each murder as na artwork in itself, even though his dysfunction gives him problems in the outside world. Despite the fact that the final and inevitable police intervention is drawing ever near (which both provokes and puts pressure on Jack) he is – contrary to all logic – set on taking greater and greater chances. Along the way we experience Jack’s descriptions of his personal condition, problems and thoughts through a recurring conversation with the unknown Verge – a grotesque mixture of sophistry mixed with na almost childlike self-pity and in-depth explanations of, for Jack, dangerous and difficult manoeuvres.
segunda-feira, 6 de março de 2017
A Bittersweet Life
Em uma madrugada de outono, o discípulo acordou chorando. Então, o mestre lhe perguntou, “Você teve um pesadelo?”
“Não.”
“Então você teve um sonho triste?” “
Não,” disse o discípulo. “Eu tive um sonho doce.”
“Então porque você está chorando com tanta tristeza?”
O discípulo enxugou suas lágrimas e calmamente respondeu, “Porque o sonho que tive nunca poderá se tornar realidade”.
O que é este filme? Um estudo de personagem, uma história de amor, um puta filme de ação. Dirigido com a típica maestria por Jee-woon Kim, A Bittersweet Life é um filme para se deleitar. Violento. Belo. E que final!
POSTER A QUADRILHA MALDITA
Que pôster belíssimo! Evoca e promete mais que um simples western, mas um desses filmes cheios de nuances e mitos nas entrelinhas brutais de um duelo à mão armada. Sensual e brutal.
ALEX
“Com certeza é impossível acreditar – a não ser que se quisesse fazer de Laranja Mecânica um filme perverso – que eu era favorável a Alex. Eu apenas tentei apresentá-lo como ele se sente e como se vê. Evidentemente, em um determinado momento, surge certa simpatia por ele. Como Alex estava em conflito com pessoas tão más como ele, mas de outra maneira, era possível pensar, se fizéssemos uma análise rápida do filme, que havia mais simpatia por ele. Mas como é uma história satírica – e a natureza da sátira é apresentar o falso como se fosse verdadeiro -, não vejo como um ser inteligente poderia achar que Alex era um herói.”
Stanley Kubrick
quarta-feira, 1 de março de 2017
FRAMES SEDE DE SANGUE
Um filme sobre fé, vampirismo, morte, vida, horror, desejo, belamente filmado como se fosse uma pintura sensual e violenta.
CONTO Restos de Carnaval
Clarice Lispector
Não, não deste último carnaval. Mas não sei por que este me transportou para a minha infância e para as quartas-feiras de cinzas nas ruas mortas onde esvoaçavam despojos de serpentina e confete. Uma ou outra beata com um véu cobrindo a cabeça ia à igreja, atravessando a rua tão extremamente vazia que se segue ao carnaval. Até que viesse o outro ano. E quando a festa ia se aproximando, como explicar a agitação íntima que me tomava? Como se enfim o mundo se abrisse de botão que era em grande rosa escarlate. Como se as ruas e praças do Recife enfim explicassem para que tinham sido feitas. Como se vozes humanas enfim cantassem a capacidade de prazer que era secreta em mim. Carnaval era meu, meu.
No entanto, na realidade, eu dele pouco participava. Nunca tinha ido a um baile infantil, nunca me haviam fantasiado. Em compensação deixavam-me ficar até umas 11 horas da noite à porta do pé de escada do sobrado onde morávamos, olhando ávida os outros se divertirem. Duas coisas preciosas eu ganhava então e economizava-as com avareza para durarem os três dias: um lança-perfume e um saco de confete. Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.
E as máscaras? Eu tinha medo mas era um medo vital e necessário porque vinha ao encontro da minha mais profunda suspeita de que o rosto humano também fosse uma espécie de máscara. À porta do meu pé de escada, se um mascarado falava comigo, eu de súbito entrava no contato indispensável com o meu mundo interior, que não era feito só de duendes e príncipes encantados, mas de pessoas com o seu mistério. Até meu susto com os mascarados, pois, era essencial para mim.
Não me fantasiavam: no meio das preocupações com minha mãe doente, ninguém em casa tinha cabeça para carnaval de criança. Mas eu pedia a uma de minhas irmãs para enrolar aqueles meus cabelos lisos que me causavam tanto desgosto e tinha então a vaidade de possuir cabelos frisados pelo menos durante três dias por ano. Nesses três dias, ainda, minha irmã acedia ao meu sonho intenso de ser uma moça – eu mal podia esperar pela saída de uma infância vulnerável – e pintava minha boca de batom bem forte, passando também ruge nas minhas faces. Então eu me sentia bonita e feminina, eu escapava da meninice.
Mas houve um carnaval diferente dos outros. Tão milagroso que eu não conseguia acreditar que tanto me fosse dado, eu, que já aprendera a pedir pouco. É que a mãe de uma amiga minha resolvera fantasiar a filha e o nome da fantasia era no figurino Rosa. Para isso comprara folhas e folhas de papel crepom cor-de-rosa, com as quais, suponho, pretendia imitar as pétalas de uma flor. Boquiaberta, eu assistia pouco a pouco à fantasia tomando forma e se criando. Embora de pétalas o papel crepom nem de longe lembrasse, eu pensava seriamente que era uma das fantasias mais belas que jamais vira.
Foi quando aconteceu, por simples acaso, o inesperado: sobrou papel crepom, e muito. E a mãe de minha amiga – talvez atendendo a meu apelo mudo, ao meu mudo desespero de inveja, ou talvez por pura bondade, já que sobrara papel – resolveu fazer para mim também uma fantasia de rosa com o que restara de material. Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.
Até os preparativos já me deixavam tonta de felicidade. Nunca me sentira tão ocupada: minuciosamente, minha amiga e eu calculávamos tudo, embaixo da fantasia usaríamos combinação, pois se chovesse e a fantasia se derretesse pelo menos estaríamos de algum modo vestidas – à ideia de uma chuva que de repente nos deixasse, nos nossos pudores femininos de oito anos, de combinação na rua, morríamos previamente de vergonha – mas ah! Deus nos ajudaria! não choveria! Quanto ao fato de minha fantasia só existir por causa das sobras de outra, engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola. Mas por que exatamente aquele carnaval, o único de fantasia, teve que ser tão melancólico? De manhã cedo no domingo eu já estava de cabelos enrolados para que até de tarde o frisado pegasse bem.
Mas os minutos não passavam, de tanta ansiedade. Enfim, enfim! chegaram três horas da tarde: com cuidado para não rasgar o papel, eu me vesti de rosa.
Muitas coisas que me aconteceram tão piores que estas, eu já perdoei. No entanto, essa não posso sequer entender agora: o jogo de dados de um destino é irracional? É impiedoso. Quando eu estava vestida de papel crepom todo armado, ainda com os cabelos enrolados e ainda sem batom e ruge – minha mãe de súbito piorou muito de saúde, um alvoroço repentino se criou em casa e mandaram-me comprar depressa um remédio na farmácia. Fui correndo vestida de rosa – mas o rosto ainda nu não tinha a máscara de moça que cobriria minha tão exposta vida infantil – fui correndo, correndo, perplexa, atônita, entre serpentinas, confetes e gritos de carnaval. A alegria dos outros me espantava.
Quando horas depois a atmosfera em casa acalmou-se, minha irmã me penteou e pintou-me. Mas alguma coisa tinha morrido em mim. E, como nas histórias que eu havia lido sobre fadas que encantavam e desencantavam pessoas, eu fora desencantada; não era mais uma rosa, era de novo uma simples menina. Desci até a rua e ali de pé eu não era uma flor, era um palhaço pensativo de lábios encarnados. Na minha fome de sentir êxtase, às vezes começava a ficar alegre mas com remorso lembrava-me do estado grave de minha mãe e de novo eu morria.
Só horas depois é que veio a salvação. E se depressa agarrei-me a ela é porque tanto precisava me salvar. Um menino de uns 12 anos, o que para mim significava um rapaz, esse menino muito bonito parou diante de mim e, numa mistura de carinho, grossura, brincadeira e sensualidade, cobriu meus cabelos já lisos, de confete: por um instante ficamos nos defrontando, sorrindo, sem falar. E eu então, mulherzinha de 8 anos, considerei pelo resto da noite que enfim alguém me havia reconhecido: eu era, sim, uma rosa.