Um dia ideal para os peixes-banana e livros e cinema e gibis e nus e ataxia espinocerebelar e 𓋹
segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
domingo, 30 de dezembro de 2012
sábado, 29 de dezembro de 2012
sexta-feira, 28 de dezembro de 2012
hellbound
Well, here he was. They could save each other, the way the poets promised lovers should. He was mystery, he was darkness, he was all she had dreamed of. And if she would only free him he would service her - oh yes - until her pleasure reached that threshold that, like all thresholds, was a place where the strong grew stronger, and the weak perished. Pleasure was pain there, and vice versa. And he knew it well enough to call it home.
― Clive Barker, The Hellbound Heart
quinta-feira, 27 de dezembro de 2012
quarta-feira, 26 de dezembro de 2012
terça-feira, 25 de dezembro de 2012
segunda-feira, 24 de dezembro de 2012
domingo, 23 de dezembro de 2012
imquirições e anseios
Nenhuma Utopia jamais poderá dar satisfação a todo mundo, o tempo todo. À medida que suas condições materiais melhoram, os homens aumentam suas expectativas e vão ficando descontentes com os poderes e posses que, antes, pareciam estar além de seus sonhos mais loucos. E, mesmo quando o mundo exterior lhes tiver concedido tudo o que é possível, ainda permanecem as inquirições da mente e os anseios do coração.
Arthur C. Clarke - O Fim da Infância
sábado, 22 de dezembro de 2012
luz do Instante
Não existe princípio nem fim, pois todas as coisas estão no Centro do Tempo. Assim como todas as estrelas podem se refletir numa gota de chuva caindo na noite, também todas as estrelas refletem a gota de chuva. Não existe escuridão nem morte, pois todas as coisas existem na luz do Instante, e seu fim e seu início são um.
Ursula K. Le Guin - A Mão Esquerda da Escuridão
sexta-feira, 21 de dezembro de 2012
any fiction
….in any fiction, no matter how ambitious its scope or profound its theme, there was only ever room for three players. Between warring kings, a peacemaker; between adoring spouses, a seducer or a child. Between twins, the spirit of the womb. Between lovers, Death. Greater numbers might drift through the drama, of course — thousands in fact — but they could only ever be phantoms, agents, or, on rare occasions, reflections of the three real and self-willed beings who stood at the center. And even this essential trio would not remain intact; or so he taught. It would steadily diminish as the story unfolded, three becoming two, two becoming one, until the stage was left deserted.
Clive Barker, opening lines of Imajica
quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Nothing ever begins
Nothing ever begins.
There is no first moment; no single word or place from which this or any other story springs.
The threads can always be traced back to some earlier tale, and to the tales that preceded that: though as the narrator’s voice recedes the connections will seem to grow more tenuous, for each age will want the tale told as if it were of its own making.
Thus the pagan will be sanctified, the tragic become laughable; great lovers will stoop to sentiment, and demons dwindle to clockwork toys.
Nothing is fixed. In and out the, shuttle goes, fact and fiction, mind and matter, woven into patterns that may have only this in common: that hidden amongst them is a filigree which will with time become a world.
It must be arbitrary then, the place at which we chose to embark.
Somewhere between a past half forgotten and a future as yet only glimpsed.
This place, for instance.
The opening of Clive Barker’s Weaveworld
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
trecho O gato por dentro
William Burroughs
O gato branco simboliza a lua prateada que se intromete nos cantos e purifica o céu para o dia seguinte. O gato branco é ‘o limpador’, ou ‘o animal que se limpa’, descrito pela palavra em sânscrito Margaras, que significa ‘o caçador que segue a trilha; o investigador; o rastreador ágil’. O gato branco é o caçador e o matador, e seu caminho é iluminado pela lua prateada. Todos os lugares e pessoas escondidos nas sombras são revelados sob essa luz suave inexorável. Você não consegue afastar seu gato branco porque seu gato branco é você. Não pode se esconder de seu gato branco, porque seu gato branco se esconde com você.
CONTO A ALMOFADA DE PENAS
Horacio Quiroga
Sua lua-de-mel foi um longo estremecimento. Loura, angelical e tímida, o temperamento duro do marido gelou suas sonhadas criancices de noiva. Ela o amava muito, no entanto, às vezes, sentia um ligeiro estremecimento quando, voltando à noite juntos pela rua, olhava furtivamente para a alta estatura de Jordão, mudo havia mais de uma hora. Ele, por sua vez, a amava profundamente, sem demonstrá-lo.
Durante três meses — tinham casado no mês de abril — viveram numa felicidade especial.
Sem dúvida ela teria desejado menos severidade nesse rígido céu de amor, mais expansiva e incauta ternura; mas a impassível expressão do seu marido a reprimia sempre.
A casa em que viviam influenciava um pouco nos seus estremecimentos. A brancura do pátio silencioso — frisos, colunas e estátuas de mármore — produzia uma outonal impressão de palácio encantado. Por dentro, o brilho glacial do estuque, sem o mais leve arranhão nas altas paredes, acentuava aquela sensação de frio desagradável. Ao atravessar um quarto para outro, os passos encontravam eco na casa toda, como se um longo abandono tivesse sensibilizado sua ressonância.
Nesse estranho ninho de amor, Alicia passou todo o outono. Porém tinha terminado por abaixar um véu sobre os seus antigos sonhos, e ainda vivia dormida na casa hostil, sem querer pensar em nada até o marido chegar.
Não é incomum que emagrecesse. Teve um ligeiro ataque de gripe que se arrastou insidiosamente dias e mais dias; Alicia não melhorava nunca. Por fim uma tarde pôde sair ao jardim apoiada no braço dele. Olhava indiferente para um e outro lado. De repente Jordão, com profunda ternura, passou a mão pela sua cabeça, e Alicia em seguida se quebrou em soluços, e o abraçou. Chorou demoradamente seu discreto pavor, redobrando o choro diante da menor tentativa de carícia. Depois, os soluços foram-se acalmando, e ainda ficou um longo tempo escondido no seu ombro, quietinha, sem pronunciar uma palavra.
Foi o último dia que Alicia esteve de pé. No dia seguinte amanheceu desacordada. O médico de Jordão a examinou com toda a atenção, recomendando muita calma e repouso absolutos.
— Não sei — disse para Jordão na porta da casa, em voz ainda baixa. — Tem uma grande debilidade que não consigo explicar, e sem vômitos, nada... Se amanhã ela acordar igual a hoje, você me chama depressa.
No dia seguinte ela piorou. Houve consulta. Constatou-se uma anemia agudíssima, completamente inexplicável. Alicia não teve mais desmaios, mas ia visivelmente andando para a morte. Durante o dia todo, o quarto estava com as luzes acesas e em total silêncio. As horas se passavam sem se ouvir o mínimo barulho. Alicia dormitava. Jordão vivia quase que definitivamente na sala, também com as luzes acesas. Andava sem cessar de um extremo para outro, com incansável obstinação. O tapete abafava seus passos. Algumas vezes entrava no quarto e continuava seu mudo vaivém ao longo da cama, olhando para sua mulher cada vez que caminhava na sua direção.
Não demorou muito para Alicia passar a sofrer alucinações, confusas e flutuantes no início, e que desceram depois até o chão. A jovem, de olhos desmesuradamente abertos, não fazia senão olhar para os tapetes que se encontravam a cada lado da cama. Uma noite ela ficou repentinamente com o olhar fixo. Em seguida abriu a boca tentando gritar, e suas narinas e lábios se molharam de suor.
— Jordão! Jordão! — gritou, rígida de espanto, sem parar de olhar o tapete.
Jordão correu para o quarto, e, ao vê-lo aparecer, Alicia deu um brado de horror.
— Sou eu, Alicia, sou eu!
Alicia olhou para ele com olhar extraviado, olhou para o tapete, voltou a olhar para ele, e depois de um longo momento de estupefata confrontação, serenou. Sorriu e pegou entre as suas as mãos do marido, fazendo carícias e tremendo.
Entre suas alucinações mais obstinadas, houve um antropóide, apoiado no tapete sobre os próprios dedos, que mantinha os olhos fixos nela.
Os médicos voltaram inutilmente. Havia ali, diante deles, uma vida que se acabava, dessangrando-se dia após dia, hora após hora, sem se saber absolutamente por quê. Na última consulta, Alicia jazia em estupor, enquanto eles a pulseavam, passando de um para outro o pulso inerte. Observaram-na um longo momento em silêncio e encaminharam-se para a sala.
— Pst... — Deu de ombros, desanimado, seu médico. — É um caso sério... pouco se pode fazer...
— Era só o que me faltava! — gritou Jordão. E tamborilou bruscamente sobre a mesa.
Alicia foi-se extinguindo no seu delírio de anemia, que se fazia mais grave pe!a tarde, mas que cedia sempre nas primeiras horas da manhã. Durante o dia, sua doença não avançava, mas de manhã ela amanhecia lívida, quase em síncope. Parecia que unicamente à noite a sua vida se fosse em novas asas de sangue. Tinha sempre ao acordar a sensação de sentir-se derrubada na cama com um milhão de quilos por cima. A partir do terceiro dia esse desmoronamento não a abandonou mais. Apenas podia mexer a cabeça. Não deixou que pegassem na sua cama, nem sequer que arrumassem a almofada. Seus terrores crepusculares avançaram na forma de monstros que se arrastavam até sua cama e subiam com dificuldade pela colcha.
Perdeu depois o conhecimento. Nos dias finais, delirou sem cessar a meia-voz. As luzes continuavam fúnebres e acesas no quarto e na sala. No silêncio agônico da casa, não se ouvia mais que o delírio monótono que saía da cama, e o rumor abafado dos eternos passos de Jordão.
Alicia morreu, por fim. A empregada, que entrou depois para desfazer a cama, já vazia, olhou um momento com estranheza para a almofada.
— Senhor! — chamou ao Jordão em voz baixa. — Na almofada há manchas que parecem ser de sangue.
Jordão se aproximou rapidamente. Também se agachou. Efetivamente, sobre a fronha, de ambos os lados da cavidade que tinha deixado a cabeça de Alicia, se viam algumas manchinhas escuras.
— Parecem picadas — murmurou a empregada depois de um momento imóvel na observação.
— Aproxime-o da luz - disse Jordão.
A moça levantou a almofada, mas em seguida deixou-a cair, e ficou olhando para ele, lívida e trêmula. Sem saber por quê, Jordão percebeu que seus cabelos se eriçavam.
— O que é que há? — murmurou com voz rouca.
— Pesa muito — falou a empregada, sem parar de tremer.
Jordão levantou a almofada; pesava extraordinariamente. Saíram com ela, e sobre a mesa da sala Jordão cortou a fronha e a capa. As penas superiores voaram, e a empregada deu um grito de horror com a boca inteiramente aberta, levando as mãos crispadas às bandós. Sobre o fundo, entre as penas, mexendo devagar os pés aveludados, havia um animal monstruoso, uma bola viva e viscosa. Estava tão inchada que quase não se lhe via a boca.
Noite após noite, a partir do dia em que Alicia tinha ficado doente, ele tinha aplicado sigilosamente sua boca — sua tromba, melhor dizendo — às têmporas da mulher, chupando-lhe o sangue. A mordida era quase imperceptível. A remoção diária da almofada tinha impedido sem dúvida seu desenvolvimento, mas assim que a jovem não conseguiu mais se mexer, a sucção foi vertiginosa. Em apenas cinco dias e cinco noites, tinha esvaziado Alicia.
Esses parasitos das aves, diminutos no seu meio habitual, chegam a adquirir proporções enormes em certas condições. O sangue humano parece ser para eles particularmente favorável, e não é raro encontrá-los nas almofadas de penas.
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
domingo, 16 de dezembro de 2012
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
POEMA tédio
Charles Baudelaire
Tenho as recordações d'um velho milenário!
Um grande contador, um prodigioso armário,
Cheiinho, a abarrotar, de cartas memoriais,
Bilhetinhos de amor, recibos, madrigais,
Mais segredos não tem do que eu na mente abrigo.
Meu cer'bro faz lembrar descomunal jazigo;
Nem a vala comum encerra tanto morto!
— Eu sou um cemitério estranho, sem conforto,
Onde vermes aos mil — remorsos doloridos,
Atacam de pref'rência os meus mortos queridos.
Eu sou um toucador, com rosas desbotadas,
Onde jazem no chão as modas despresadas,
E onde, sós, tristemente, os quadros de Boucher
Fuem o doce olor d'um frasco de Gellé.
Nada pode igualar os dias tormentosos
Em que, sob a pressão de invernos rigorosos,
O Tédio, fruto inf'liz da incuriosidade,
Alcança as proporções da Imortalidade.
— Desde hoje, não és mais, ó matéria vivente,
Do que granito envolto em terror inconsciente.
A emergir d'um Saarah movediço, brumoso!
Velha esfinge que dorme um sono misterioso,
Esquecida, ignorada, e cuja face fria
Só brilha quando o Sol dá a boa-noite ao dia!
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
TO THE STONE
What I’m trying to say is, it must be tough on you not being able to read, but it’s not the end of the world. You might not be able to read, but there are things only you can do. That’s what you have to focus on - your strengths. Like being able to talk to the stone.
— Haruki Murakami, Kafka on the Shore
trecho MASTIGANDO HUMANOS
Santiago Nazarian
"Solidão? Sim, isso existe, mas é uma confluência dessas três motivações. A falta do desejo. O medo da morte. A culpa da fome. Manifestam-se num ser como eu de maneira muito mais objetiva. Não recorro à amizade de um cachorro para me fortalecer. Mas também não preciso recorrer à crueldade. Se ele quer estar ao meu lado, o que me custa permitir? E, de qualquer forma ele sempre pode trazer amiguinhos para me saciar..."
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
domingo, 9 de dezembro de 2012
sábado, 8 de dezembro de 2012
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
terça-feira, 4 de dezembro de 2012
TRECHO Eating the Birds from The Tent
Margaret Atwood
We ate the birds. We ate them. We wanted their songs to flow up through our throats and burst out of our mouths, and so we ate them. We wanted their feathers to bud from our flesh. We wanted their wings, we wanted to fly as they did, soar freely among the treetops and the clouds, and so we ate them. We speared them, we clubbed them, we tangled their feet in glue, we netted them, we spitted them, we threw them onto hot coals, and all for love, because we loved them. We wanted to be one with them. We wanted to hatch out of clean, smooth, beautiful eggs, as they did, back when we were young and agile and innocent of cause and effect, we did not want the mess of being born, and so we crammed the birds into our gullets, feathers and all, but it was no use, we couldn’t sing, not effortlessly as they do, we can’t fly, not without smoke and metal, and as for the eggs we don’t stand a chance. We’re mired in gravity, we’re earthbound. We’re ankle-deep in blood, and all because we ate the birds, we ate them a long time ago, when we still had the power to say no.
segunda-feira, 3 de dezembro de 2012
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
TRECHO diário de um médico louco
Edson Amâncio
“… já na minha infância fui tomado por estranhos pressentimentos e muitas vezes chamado de habitante ´do mundo da lua´. De tal forma era envolvido por êxtases e arrebatamento da alma que me perguntava se não estaria vivendo um sonho. Que tipo de sortilégio me dominava o espírito ainda na minha mais tenra infância! Meus pais, cujo equilíbrio mental está exageradamente distante de exemplar, levaram-me aos curandeiros da vizinhança e um deles me faz passar a mais terrível experiência que uma criança é capaz de suportar. Colocaram-me nu, sentado no chão, coberto de folhas de bananeira de uma cabana e despejaram sobre a minha cabeça o sangue ainda quente de uma galinha esgorjada…”
quinta-feira, 29 de novembro de 2012
CONTO uma simples promessa
José marcelo
A fada de boca macia sorriu e disse
__ Vamos dar uma volta.
Havia mais que uma simples promessa no jeito dela falar.
Ele a acompanhou até lá fora e ambos ficaram olhando as nuvens muito brancas sob a lua oculta. Então, ele segurou o braço da fada e beijou-a. A boca dela era tão boa como ele imaginava.
__ Você sabe o que acontece agora.
Ele disse que sabia, que não se importava, mas queria mais um minuto. Queria beijá-la de novo. Ela assentiu.
Depois ela o levou até o alto da colina ali perto e deitaram-se um ao lado do outro, como irmãos. Ele fechou os olhos. Não queria vê-la quando se transformasse. Preferia lembrar do rosto belo, quase divino, que simplesmente o hipnotizara.
Esperou pela morte... e esperou.
Então sentiu o hálito quente dela em seu ouvido.
__ Hoje não. Não __ disse ela.
Ele abriu os olhos e ela não estava mais lá.
Por que ela não o matara, ele só descobriria anos depois, já velho e exausto, quando em um dia quente ele a vira acenar-lhe do outro lado de uma rua movimentada, no centro da cidade.
E, instantes depois, ela estava ao seu lado, dizendo
__ É hoje.
__ Por que demorou?
__ Porque gosto de você.
__ Mas era seu direito, cobrar a dívida naquele dia...
__ Sim, era.
__ Mas você não o fez.
__ Não. Mas estou fazendo agora. Pelos termos de nosso pacto.
__ Tudo bem. Como vai ser?
__ Rápido.
__ Tenho um último pedido.
__ Não que eu precise que consentir.
__ Não. Sei que não.
__ Você é como um amor que se tem na juventude e então anos depois nós nos encontramos de novo e você não mudou nada e eu estou... velho.
__ Eu sei o que você quer.
__
__ Um beijo __ disse ela e beijou-o apaixonadamente, ali mesmo, no meio da rua, entre as pessoas que passavam apressadas.
Um beijo longo e tão bom como ele se lembrava.
__
Ele não percebeu quando ela o matou. Apenas estava vivo e depois já não estava.
terça-feira, 27 de novembro de 2012
domingo, 25 de novembro de 2012
open
And it came to me then. That we were wonderful traveling companions but in the end no more than lonely lumps of metal in their own separate orbits. From far off they look like beautiful shooting stars, but in reality they’re nothing more than prisons, where each of us is locked up alone, going nowhere. When the orbits of these two satellites of ours happened to cross paths, we could be together. Maybe even open our hearts to each other. But that was only for the briefest moment. In the next instant we’d be in absolute solitude. Until we burned up and became nothing.
-sputnik sweetheart, haruki murakami