terça-feira, 27 de dezembro de 2016

POEMA Júlia, dos olhos castanhos

Heitor Henrique

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Do cheiro de adeus

Júlia

que deseja voar

que é um poema católico apostólico romano

Júlia

que flutua entre as flores

troca de roupa e de perfume

que é um pássaro

um trecho do poema do Gullar

Júlia

que acorda e sorri

que abre as janelas do quarto

que sabe das cláusulas pétreas

Júlia

que se banha no mar

que não gosta de cerveja

que tem amores primaveris antes da chuva.

Júlia

que tem cabelos longos

e riso fácil

e se perde entre as ruas da cidade

e que fala do amor e da poesia com devoção.

Que se vê nas tardes de sábado de bicicleta

e aos domingos na missa

Júlia

dos olhos castanhos

do sotaque arrastado, nordeste

Eu pensei que fosse um pássaro

Eu achei que fosse uma música do caetano.

Júlia

das sapatilhas brancas

das unhas pintadas

dos desejos velados.

Júlia do som da chuva

do cheiro de terra molhada

das rosas, margaridas e girassóis

Júlia da elegância recorrente

da formosura juvenil

do erotismo sutil

Júlia, dos olhos castanhos.

Das mãos cheias d´agua em formato de concha

da maquiagem saindo do rosto ingênuo

Júlia da careta, do bar, da praia, do poema

Mas jamais Júlia minha.

Júlia do adeus, do até logo, do foi bom te ver

Júlia, que voa como um pássaro

desfila como uma francesa

enquanto eu tomo uma cerveja gelada.

Júlia, que vai embora como a protagonista da série de TV

quando briga com o diretor de produção.

Que escreve cartas de amor e guarda na bolsa.

Júlia

que é encanto e beija-flor

que passou por esse bar uma vez

tomou um vinho, ouviu um poema

e partiu.

.

terceiro ato.


TRECHO O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio

Charles Bukowski

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"Acho que você tem que enfiar a cara na lama, de vez em quando, acho que você tem que saber o que é uma prisão, o que é um hospital. Acho que você tem que saber o que é ficar sem comer por quatro ou cinco dias. Acho que viver com mulheres loucas faz bem para a espinha. Acho que você pode escrever com satisfação e liberdade depois de passar pelo aperto. Só digo isso porque todos os poetas que conheci têm sido uns frouxos, uns parasitas. Não tinham nada pra escrever, exceto sua egoísta falta de persistência."

 

POSTER A CASA QUE JACK FEZ (CONSTRUIU)

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O novo filme de Lars Von Trier é sobre um psicopata e seu inferno particular. Deve ser pelo menos polêmico.

WESTWORLD E O DISCURSO DE FORD

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“Bem-vindos, boa noite,

Desde que eu era criança, sempre gostei de uma boa história. Acredito que histórias podem nos ajudar a nos enobrecer, consertar o que está quebrado e nos ajudar a nos tornar as pessoas que sonhamos ser. Mentiras que contam uma verdade profunda. E eu sempre pensei que podia fazer parte desta grande tradição e por minhas dores consegui isto: uma prisão para nossos próprios pecados.

Porque vocês não querem mudar. O que posso mudar? Pois vocês são apenas humanos no fim das contas. Mas então percebi que alguém estava prestando atenção. Alguém que podia mudar. E então comecei a escrever uma nova história para eles, que começa com o nascimento de um novo povo e as escolhas que eles terão de fazer e as pessoas que eles decidirem se tornar. E terá todas aquelas coisas que vocês sempre gostaram. Surpresas. E violência. E começa em uma época de guerra. Com um novo vilão chamado Wyatt. E a matança é feita numa escolha.

Fico triste em dizer que esta é minha história final. Um velho amigo uma vez me disse que algo que me deu muito conforto, algo que ele leu. Ele disse que Mozart, Beethoven e Chopin nunca morreram. Eles simplesmente se tornaram música. Então espero que vocês gostem desta última obra, bastante.”

blog do matias.

“Serei a Princesa Leia para sempre”

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Trecho Diário de um ano ruim

J.M. Coetzee

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OPINIÕES FORTES:

13. Do corpo

Falamos do cachorro com a pata machucada e do pombo de asa quebrada. Mas o cachorro não pensa em si mesmo nesses termos, nem o pássaro. Para o cachorro, quando ele tenta andar existe apenas Sou dor; para o pássaro, quando ele se lança em vôo, simplesmente Não consigo.

Conosco parece ser diferente. O fato de existirem expressões tão comuns quanto"minha perna","meu olho","meu cérebro" e mesmo"meu corpo" sugere que acreditamos que exista alguma entidade não-material, talvez irreal, que mantém uma relação de possuidor/possuído no que se refere às"partes" do corpo e mesmo ao corpo todo. Ou então a existência dessas expressões mostra que a linguagem não encontra um ponto de apoio, não consegue se desenvolver enquanto não tiver fracionado a unidade da experiência.

Todas as partes do corpo não estão catexizadas no mesmo grau. Se um tumor fosse extraído de meu corpo e me apresentado numa bandeja cirúrgica como"seu tumor", eu sentiria repulsa por um objetio que é, em certo sentido,"de" mim, mas que repudio, e de cuja eliminação até mesmo me alegro; enquanto se uma de minhas mãos fosse cortada fora e mostrada para mim, eu sem dúvida sentiria a mais aguda dor.

Sobre cabelo, unhas cortadas e outros que tais não há sentimentos, uma vez que essas perdas pertencem a um ciclo de renovação. Dentes são mais misteriosos. Os dentes da"minha" boca são"meus" dentes, partes de"mim", mas minha sensação deles é menos íntima do que meus sentimentos, digamos, por meus lábios. Os dentes não me parecem nem mais nem menos"meus" do que as próteses de metal ou porcelana em minha boca, obras de dentistas cujos nomes esqueci. Eu me sinto mais dono ou tutor de meus dentes do que sinto que meus dentes sejam parte de mim. Se um dente estragado tivesse de ser extraído e me fosse mostrado, eu não sentiria grande pena, embora meu corpo ("eu") nunca vá regenerá-lo.

Esses pensamentos sobre o corpo não ocorrem no abstrato, mas em relação a uma pessoa específica, X, sem nome. Na manhã do dia em que morreu, X escovou os dentes, cuidando deles com a diligência que aprendemos na infância. De suas abluções, ele emergiu para enfrentar o dia, e antes que o dia terminasse estava morto. Seu espírito partiu, deixando para trás um corpo que não servia para nada; pior do que não servir para nada, porque logo começaria a se deteriorar e a se transformar em ameaça à saúde pública. Parte desse corpo morto era o conjunto completo de dentes que ele escovou de manhã, dentes que também morreram no sentido de que o sangue cessou de correr por suas raízes, ainda que eles, paradoxalmente, tenham deixado de entrar em decomposição à medida que o corpo esfriava e que suas bactérias orais também esfriavam e se extinguiam.

Se X tivesse sido enterrado na terra, as partes de"seu" corpo que viveram mais intensamente, que eram mais"ele", teriam apodrecido, enquanto"seus" dentes, que ele podia sentir como coisas apenas sob seus cuidados ou custódia, teriam sobrevivido.

Mas é claro que X não foi enterrado, e sim cremado; e as pessoas que construíram o forno em que ele foi consumido certificaram-se de que estivesse quente o bastante para transformar tudo em cinzas, mesmo os ossos, mesmo os dentes. Mesmo os dentes.

 

TRAILER Merry Christmas Mr. Lawrence

David Bowie em estado de graça nesse filmaço de Nagisa Oshima. Veja, reveja.

sábado, 24 de dezembro de 2016

FILME Beat The Devil / O DIABO RIU POR ÚLTIMO

On their way to Africa are a group of rogues who hope to get rich there, and a seemingly innocent British couple. They meet and things happen...

Stars: Humphrey Bogart, Jennifer Jones and Gina Lollobrigida. Director: John Huston. Writers: James Helvick (novel), Truman Capote (screenplay)

O LADRÃO DE FRAMES

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“Eu roubo de todos os filmes que já foram feitos. Adoro fazer isso. Se existe algo na minha obra, é porque eu roubei isto deste filme ou aquilo daquele outro e misturei tudo junto. Se as pessoas não gostam, azar o delas, não assistam, certo? Eu roubo de todo o mundo. Grandes artistas roubam, não fazem homenagens.”

QUENTIN TARANTINO

Guga's Blog

TRAILER Taboo

A junção de Steve Knight e Tom Hardy em uma obra que evoca mistérios, crimes e tabus promete uma puta série.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2016

ALAN MOORE SAYS

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“My own thoughts about this is that there is no good, there is no evil. It is much more like a play in which we have no choice as to our actions and yet that is only when looked at from a higher level, looked at from somewhere with more than four dimensions.”

PÁGINA ENCRUZILHADA

Encruzilhada (Veneta), por Marcelo D’Salete

por Marcelo D’Salete.

vitralizado.

TRECHO DEUSES AMERICANOS

NEIL GAIMAN

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“Sabem, acho que prefiro ser homem do que deus. A gente não precisa de ninguém para acreditar na gente. A gente vai seguindo em frente de qualquer jeito. É o que fazemos. ”

FRAMES BLADE RUNNER 2049

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Então o mais novo filme do fera Denis Villeneuve é a continuação do cult dos filmes cults Blade Runner.  Fosse um diretor qualquer, eu estaria no mínimo puto, mas em Villeneuve eu confio. Até agora.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

Terror is

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“Terror is a much subtle thing. You don’t have to have one drop of blood to have your hair standing on end… I would rather scalpel at the mind, a little bit more and more until, finally, the audience goes crazy… That’s my favorite kind of story. It’s not easy to do for most writers; I don’t know why. But it is always the most satisfying.”

Richard Matheson

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segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

domingo, 18 de dezembro de 2016

sábado, 17 de dezembro de 2016

FRAMES RAN

RAN

 

A melhor adaptação de Rei Lear. Feita pelo magnifico Akira Kurosawa. Uma pintura em movimento. Um filme a um tampo grandioso e intimista. Fascinante.

A RAZÃO O MEDO

É que não há razão válida para temeres o que quer que seja; nós, isso sim, deixamo-nos abalar e atormentar apenas por vãs aparências. Nunca ninguém analisou o que há de verdade no que nos aflige, mas cada um vai incutindo medo nos outros; nunca ninguém se atreveu a aproximar-se do que lhe perturba o espírito e a averiguar a natureza real e fundamentada do seu medo.
Sêneca, em “Cartas a Lucílio”

FRAMES A GENERAL

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O filme preferido de Buster Keaton funciona como comédia e romance e guerra e aventura – absolutamente brilhante.

FRAMES 2001 uma odisseia no espaço

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A sci-fi hard  definitiva.

CAPA O HOMEM DO CASTELO ALTO

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Um puta livro. Nada mais a dizer.

DEIXE ELA ENTRAR

Filme completo e legendado. Um filmaço sobre vampirismo, amor, vida, horror.

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

VOZES E TRAÇOS

Um documentário  sobre a cena brasileira de quadrinhos independentes.

vitralizado.

BASTIDORES CORAÇÃO SELVAGEM

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Um conto de fadas amoral e violento. Surreal. Insano. Absurdo. Fascinante. Uma história de amor apaixonante. Um road-movie cheio de sangue e crime e sexo – e fogo, muito fogo.  É um dos melhores de David Linch. Apenas veja.

Morte exemplar

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“Junto à de Italo Svevo, outra morte admirável, que assegura sua fama de gênio e de figuraça até a sepultura: ‘Se minhas fontes são fidedignas, Buster Keaton teve um final exemplar. Alguém, ao lado de sua cama de enfermo, observou: ‘Já não vive mais.’ ‘Para saber isso’, respondeu outro, ‘tem que lhe tocar os pés; as pessoas morrem com os pés frios.’ ‘Joana D’Arc, não’, disse Buster Keaton, e caiu morto.”

[ Enrique Vila-Matas, citando Bioy Casares; “El viajero más lento”, Anagrama, 1992. ]

sorte e azar s/a.

Zéfiro Explícito

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

ELVIS POR BOLÃNO

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Elvis: “Elvis forever. Elvis com uma estrela de xerife dirigindo um Mustang e se empanturrando de comprimidos, e com sua voz de ouro.”

Roberto Bolãno

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

sábado, 10 de dezembro de 2016

FRAMES Old Boy

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Meu primeiro filme de Chan-wook Park. Uma obra ímpar, com um desses puta finais que conseguem elevar ainda mais o que já era perfeito.

SOBRE RUMBLE FISH (o selvagem de motocicleta)

Fabián Casas

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Tínhamos um ritual, eu e meus coroas. Quando comecei a crescer e já não festejava meus aniversários, saíamos os três juntos a sós (sem meus irmãos, sem mais ninguém) para algum lugar que eu escolhesse. O último aniversário que festejamos desta maneira foi o meu de 23. Eu tinha voltado de uma viagem de dois anos e estava contente de estar com eles outra vez. Propus que fôssemos ver Rumble Fish, o filme de Coppola que então passava num cinema na rua Esmeralda e que era promovido como de aventuras juvenis com os galãzinhos ianques do momento. A Lei da Rua era o subtítulo em espanhol. Eu o tinha visto exatamente na semana de meu regresso sem glória. E sabia que não era um simples filme de aventuras juvenis. De fato, creio que nunca antes havia saído do cinema tão perturbado. Rumble Fish contava uma história linear, de cabo a rabo e sem complicações. Porém, também respirava ao fundo um arsenal misterioso (como nos grandes relatos de H.P. Lovecraft) que, de alguma maneira, Coppola havia conseguido sintetizar em som, imagem e texto. Cada fotograma de Rumble Fish tinha uma ontologia que verticalizava isso. Trabalhava, para dizer em termos de bruxaria, sobre o nagual e não tanto sobre o tonal (Ver Carlos Castaneda, Relatos de Poder: A Explicação dos Bruxos). Desde então voltei a ver esse longo e obscuro poema um montão de vezes.

Meu pai dormiu na metade do filme. Minha mãe se angustiou e me recriminou por tê-la levado para ver coisas nas quais tudo terminava mal. O certo é que durante sua curta vida ela e eu poucas vezes chegamos a nos entender.

E por que eu queria que os meus coroas vissem esse malfadado filme?

Creio que porque Rumble Fish surge do território dos sonhos (aonde minha mãe vive agora). Creio também que, se se tratasse somente de um filme, a coisa não passaria de um comentário à margem. Porém Rumble Fish é um poema que infecta o corpo de um filme para trazer-nos notícias do mundo submerso. O mundo de que somos feitos tanto os pais quanto os filhos (do qual não se pode escapar), porém ao qual, em algum momentos de nossa educação, perdemos de vista. A religião se institucionalizou enquanto estávamos acordados, porém se criou enquanto sonhávamos.

Como todo grande poema, Rumble Fish não está concluído. Está sempre por fazer-se a cada vez que alguém se aproxima (não se mostra a ninguém, este tipo de filme, deve-se se aproximar deles como se tratasse de um animal luminoso). Afirmei que eu o assisti ao longo dos anos, em diferentes momentos (anos bons, anos maus, anos insípidos) e sempre me produziu algo diferente. Talvez por isso seja um clássico, quer dizer, uma obra que de alguma maneira estabelece ela mesma os parâmetros sob os quais será compreendida. Não depende de nenhuma conjuntura e sua matéria essencial não tem prazo de validade. Como respondeu Eugenio Montale a Pasolini quando este o acusou de burguês porque cantava a passagem do tempo em vez de refletir as injustiças sociais: “Querido Malvolio, não se deve trocar o essencial pelo transitório”. Sem dúvida existem injustiças sociais. Num momento central do filme, Rusty James (Matt Dillon), depois de receber uma porrada, diz ao seu irmão (Mickey Rourke) em tom de lamento: “Quero voltar pra casa”. Pedido que os gnósticos antigos fizeram há milhões de anos e pelo qual, entre outras coisas, foram perseguidos até o extermínio.

O certo é que o caminho para casa nunca esteve muito bem sinalizado. Para encontrá-lo, parecia dizer Rumble Fish, há que se desprender dos afetos e não se deixar prender pelo mundo convencional da vida ordinária (o irmão mais velho deve abandonar o menor, sacrificando-se para que este reviva, segundo a cantilena eterna dos mitos). Apesar de que se tornar inacessível e nômade, como o garoto da motocicleta que encarna Rourke, é uma tarefa de impecabilidade titânica.

Disse o chefão Francis: “Rumble Fish é uma espécie de romance existencial para jovens. Seu tema diz que é necessário abandonar as pessoas que se ama se você quiser sobreviver. E seu herói é um rapaz que idolatra seu irmão mais velho. Minha idéia foi fazer um filme de vanguarda para adolescentes, coisa que praticamente não existe. Em música se pode fazer isso, sabe-se que os jovens têm um ouvido que aceita a inovação e a complexidade. Porém nunca se tenta fazer isso no cinema”.

Coppola estava vindo de fundir a cabeça e a carteira com Apocalypse Now e então preferiu trabalhar estilisticamente sobre um filme de baixo orçamento e com atores jovens (Rourke, Dillon, Chris Penn, Nicolas Cage, Diana Lane, Larry Fishburne). Da patriotada do Vietnã trouxe somente Dennis Hopper (Coppola parecia dizer que se não mataram Hopper no final de Easy Rider, o destino que iria encontrar era ser um advogado bêbado que vive do seguro social. Fim da contracultura), que interpretava o pai bebum dos irmãos. Tom Waits (esse filme também tem a particularidade de que Tom Waits não faz o papel de Tom Waits, como em muitos outros filmes péssimos) fazia um papel curto, porém inesquecível e Sofia Coppola interpretava uma menina chata (até hoje continua fazendo o mesmo papel). Foi filmada em Tulsa — onde simultaneamente se rodou também The Outsiders — e quando finalmente estreou, os críticos o demoliram a pauladas. Grande parte do público adormeceu no cinema assim como o meu coroa e foi um fracasso comercial da Zoetrope.

Para falar de Rumble Fish é necessário dispor diante dos enunciados a palavra “parece”. O filme de Coppola parece um filme sobre gangues similar aos de James Dean. Parece uma homenagem do diretor de O Poderoso Chefão a esse subgênero conhecido como melodrama juvenil. Também parece a história de iniciação de um adolescente tratando de percorrer os caminhos do herói segundo traçados por Joseph Campbell. O romance juvenil de Susan Eloise Hinton no qual é baseado o filme é simplório e de vôo baixo. Porém sob a releitura de Coppola algo se torna sério. Como costuma acontecer com a obra de Kafka, pode-se interpretar o filme dos mais diversos ângulos. O psicanalítico, marxista, estruturalista, etc, Slavoj Zizek também poderia fazer uma embrulhada lacaniana com Rumble Fish. Sem dúvida, creio que o valor essencial desse poema de Coppola reside em sua zona de ininterpretabilidade. Para começar, apesar de ser cruzado o tempo todo por relógios e de que um de seus personagens (Benny/Waits) reflete sobre a passagem do tempo, a época na qual transcorre a história não é possível de ser datada. Somente Rusty James num dado momento faz alusão aos Beach Boys. Cada cena é unida por imagens aceleradas da cidade ou da passagem das nuvens num céu estranho. As sombras das escadas se espicham ou alongam num alarde impressionista cuja partitura extraordinária é a música de Stewart Copeland. As silhuetas dos personagens também aparecem em sombras que as precedem, como se se tratasse de uma grande alegoria das cavernas. E tudo está cercado por uma fumaça branca de origem desconhecida. Porém, é claro que não é a fumaça de gelo seco que antecede a entrada das bandas de rock, mas a névoa de Amarcord na qual os homens e as bestas se perdem.

Há pouco tempo li uma reflexão de Bergman sobre Andrei Tarkovski: “Quando o cinema não é documento, é sonho. Por isso Tarkovski é o maior de todos: ele se move com liberdade absoluta no mundo dos sonhos”. É verdade. Vou cometer a estupidez de enunciar uma lei estritamente pessoal: o cinema que me impacta é aquele que, num movimento mental spinoziano, tenta sair do cinema porque no cinema somente se pode aspirar ganhar algum festival e ocupar um lugar como jurado noutra futura data de outro bendito evento cinematográfico. Isso não tem nada a ver com filmar poemas. Neste sentido, Solaris, O Sacrifício, Stalker ou o grandioso The Night of The Hunter, de Charles Laughton trabalham em terrenos oníricos e são irmãos de Rumble Fish. Quando se faz dia, haja o que houver, lá está o ruído metalúrgico das associações dos críticos, as fotocopiadoras da cultura e o sistema de pontuação desportiva. É comum que um crítico cinematográfico assista a um filme numa cabine privada e depois tenha que correr para publicar sua reflexão assalariada. Isso também acontece com os críticos de livros e musicais. Como pode ser que alguém tenha pronta em algumas horas uma crítica que talvez leve uns vinte anos para sedimentar-se no espírito para saber o que foi que vimos exatamente? Sabemos que existem essas demandas e que é necessário ganhar a vida, porém ao menos poderíamos deixar de nos levar tão a sério. Já escutei críticos pontificando um filme ou usando a expressão “escrevi a favor” ou “escrevi contra”. O mesmo se passa com festivais: surge uma irrefreável ansiedade por tratar de consumir tudo o que nos põem no prato. Essa é a retórica da indústria, como na Bienal do Livro ou no Congresso da Língua. Porém filmar um poema não tem absolutamente nada a ver com isso.

Rumble Fish é um filme de baixo orçamento de Francis Ford Coppola. É, provavelmente, o ponto mais alto desse diretor e também do protagonista central: Mickey Rourke. Fala sobre a relação de dois irmãos aprisionados num bairro da periferia, sem saída. Um deles é quase um mito, tanto que não tem nome e seu nome é sua função: o Garoto da Motocicleta. O outro quer ser como ele. O filme é pleno de significação, com símbolos a granel. Porém, da mesma forma — e isto o torna fascinante — termina sendo inalcançável. As paredes das ruas têm grafitti pichados que dizem: The motorcycle boy reigns. Aqueles que tiveram a desgraça ou a sorte de crescer num bairro, sabemos o que isso significa.

[ Rumble Fish: a cantilena eterna dos mitos (de Ensayos Bonsai, Fabián Casas, 2007; tradução JRT ]

sorte e azar s/a.

domingo, 4 de dezembro de 2016

sábado, 3 de dezembro de 2016

FRAMES EXCALIBUR

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A melhor adaptação das lendas Arthurianas para o cinema é um filme melancólico, belíssimo, uma dessas obras perfeitas que não se esquece.

POSTER THE EVIL DEAD

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The Evil Dead é um desses filmes baratíssimos carregado de talento e inventividade. Um terror hilariante. Uma comédia de humor-negro. E, claro, o que é sempre divertido, bastante sangrento. Um puta trash.

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A atmosfera aterrorizante parece evocar um mundo sem fim ou o fim de um mundo bizarro e perturbador. Puta trailer que promete um puta jogo.